A médica veterinária *Débora Malta, da Comissão Estadual de Animais Silvestres e Meio Ambiente do CRMV/BA, preparou um material informativo sobre a Febre Amarela.

No texto a profissional discorre sobre as ocorrências registradas na Bahia e explica sobre os primatas mais suscetíveis  e as diferenças entre os perfis  urbano e silvestre  de transmissão da enfermidade.

Disponível em  PDF  para compartilhamentos.


*MV Débora Malta é professora universitária e voluntária da ONG Animallia

 

INFORMATIVO SOBRE FEBRE AMARELA

A Febre Amarela (FA) é uma doença febril aguda de grande importância epidemiológica por sua gravidade clínica e potencial de disseminação. O agente etiológico é um arbovírus da família Flaviridae, apresenta dois ciclos de transmissão epidemiologicamente distintos:o  silvestre e o urbano. Do ponto de vista etiológico, clínico, imunológico e fisiopatológico, a doença é a mesma nos dois ciclos. No ciclo silvestre da febre amarela, os primatas não humanos (PNH) são os principais hospedeiros e amplificadores do vírus, e os vetores são mosquitos com hábitos estritamente silvestres, sendo os gêneros Haemagogus e Sabethes os mais importantes na América Latina. Nesse ciclo, o homem não imunizado participa como um hospedeiro acidental ao adentrar áreas de mata. No ciclo urbano, o homem é o único hospedeiro com importância epidemiológica e a transmissão ocorre a partir de vetores urbanos (Aedes aegypti) infectados.

Imagem: Ministério da Saúde

Características dos primatas não humanos

Em todo o mundo, existem 376 espécies de primatas não humanos descritas (Wilson; Reeder, 2005). O interesse em estudar os primatas não humanos advém de uma série de peculiaridades que apresentam, dada a proximidade evolutiva com os seres humanos; eles são os mais próximos do homem no Reino Animal, com semelhanças físicas e comportamentais (Defler, 2003). Os PNH são separados em dois grandes grupos: os macacos do Velho Mundo (Catarrhini), distribuídos pela África e Ásia, possuem focinho longo e narinas voltadas para baixo; e os macacos do Novo Mundo (Platyrrhini), distribuídos pelas Américas, também denominados primatas neotropicais, possuem focinho curto, nariz achatado e narinas voltadas para os lados (Reis et al., 2008). Os primatas neotropicais são exclusivamente arborícolas, raramente descendo ao chão (Auricchio, 1995). Todos os primatas neotropicais incluem frutos em sua dieta (NOWAK, 1999). Porém, alguns gêneros adotam dietas generalistas (Sapajus spp.), enquanto outros adotam dietas especializadas, como alimentação com folhas (Alouatta spp.), gomas e exsudatos de árvores (Callitrichidae), frutos imaturos (Pitheciidae) e insetos (Saimiri spp.). A procura de alimento relaciona-se com as necessidades nutricionais e morfofisiológicas do animal (Ayres; Martins, 1989). Portanto, cada gênero possui hábito alimentar que está diretamente relacionado ao ambiente em que vive.

O Brasil destaca-se por possuir a maior diversidade de primatas do mundo, com 110 espécies conhecidas atualmente, das quais 69 são endêmicas,incluindo espécies e subespécies (Rylands et al., 2000). Como se fosse necessário encontrar um motivo pelo qual os animais podem ser úteis ao homem, pode-se chamar a atenção para estudos sobre a febre amarela, cuja presença em primatas sinaliza a circulação viral e ajuda a desenvolver estratégias de prevenção da doença em humanos. Em regiões com habitações humanas, a morte de primatas, como os dos gêneros Sapajus e Alouatta, é um alerta para a saúde pública, justificando a importância do monitoramento desses animais, já que a erradicação da doença no seu ciclo silvestre é impossível (Reis et al., 2008).

Até 04 de maio de 2017, foram notificados ao Ministério da Saúde 3.140 casos suspeitos de febre amarela silvestre no país. Destes, 729 (23,2%) foram confirmados, 663 (21,1%) casos permanecem em investigação e 1.748 (55,7%) foram descartados. Do total de casos notificados, 410 evoluíram para óbito, sendo que 249 (60,7%) foram confirmados, 45 (11,0%) permanecem em investigação e 116 (28,3%) foram descartados. A taxa de letalidade entre os casos confirmados foi de 34,2%. Os estados com maior número de casos notificados de FA, com início dos sintomas em 01 de dezembro de 2016, por local provável de infecção foram: Minas Gerais, Espírito Santo, São Paulo, Rio de Janeiro, Goiás, Pará e Distrito Federal (Informe COES Febre Amarela nº 39/2017). Sobre a vigilância das epizootias, até 04 de maio de 2017, foram notificadas ao Ministério da Saúde, 3.660 epizootias em PNH, das quais 1.491 permanecem em investigação, 96 foram descartadas e 474 foram confirmadas para FA por critério laboratorial ou vínculo epidemiológico com epizootias em PNH ou casos humanos confirmados em áreas afetadas (municípios com evidência de circulação viral) e ampliadas (municípios limítrofes àqueles afetados), envolvendo 5.352 animais.

No estado da Bahia, até 08 de maio de 2017, foram registradas 255 epizootias em PNH notificadas, distribuídas em 78 municípios. Dessas, 54 tiveram PCR detectável para FA (positivo) em 28 municípios: Alagoinhas, Barrocas, Biritinga, Camaçari, Candeias, Catu, Cordeiros, Esplanada, Feira de Santana, Ichú, Irará, Itaparica, Ituberá, Lauro de Freitas, Mata de São João, Nova Viçosa, Ouriçangas, Paulo Afonso, Pedrão, Riachão do Jacuípe, Salvador, Santa Rita de Cássia, São Felipe, São Francisco do Conde, São Gonçalo dos Campos, São Miguel das Matas, Saúde e Vera Cruz.

A FA clássica é caracterizada pelo período de infecção, seguido de período de remissão, podendo evoluir para a cura ou para a forma grave (período de intoxicação), quando o paciente apresenta deterioração do quadro clínico. Assim, recomenda-se que TODOS os pacientes de FA sejam acompanhados por pelo menos 3 dias após o período de melhora, a fim de descartar degeneração por quadro toxêmico.

Dos casos humanos na Bahia até 08de maio de 2017, foram notificados 15 casos suspeitos de FA em oito municípios (Itiúba – 1, Coribe – 4, Itamaraju -1, Mucuri -1, Nova Viçosa -1, Teixeira de Freitas – 3, Ilhéus – 1, Feira de Santana – 1, LPI em investigação – 2). Desses, 14 foram descartados para FA (por exames para FA negativos e sinais e sintomas incompatíveis ou por confirmação laboratorial para Chikungunya) e 01 caso permanece em investigação, dependendo de resultados laboratoriais. Os residentes de Coribe, Ilhéus e Itiúba são da zona rural. A faixa etária mais acometida foi de 35 a 39 anos (20%).

Em abril de 2017, o Ministério da Saúde, seguindo recomendação da Organização Mundial da Saúde, reconheceu uma dose da vacina contra febre amarela como sendo suficiente para garantir proteção por toda a vida, e passou a adotar no país o esquema de dose única (0,5ml) a partir dos 09 meses de idade (Nota Informativa 94/2017). Nesse contexto, a Coordenação de Imunizações e Vigilância Epidemiológica de Doenças Imunopreveníveis (CIVEDI) orienta a todos os municípios baianos que considerem vacinados os indivíduos, a partir de 09 meses de idade, que comprovarem pelo menos uma dose da vacina, não sendo mais necessária administração de dose de reforço. Desta forma, a população alvo a ser vacinada nas áreas com recomendação de vacinação do Estado são as crianças de 9 meses de idade até as pessoas com 59 anos de idade que nunca tenham tomado a vacina. Pessoas acima de 60 anos, gestantes e mulheres amamentando crianças menores de 06 meses residentes nessas áreas também poderão receber a vacina, desde que passem previamente por uma avaliação médica do risco-benefício. Indivíduos com comorbidades que contraindiquem a vacinação não deverão ser vacinados. Atualmente, a área considerada com recomendação da vacina contra febre amarela (ACRV) no Estado da Bahia envolve 95 municípios, sendo 45 municípios já faziam parte desta área, 35 passaram a ter recomendação temporária de vacinação para FA e 15 que não tinham essa recomendação vacinal, mas passaram a fazer parte dessa área, porque registraram ocorrência de epizootia em PNH confirmada laboratorialmente para essa doença.

EPIZOOTIAS – Morte de macaco suspeita de FA Primata não humano, de qualquer espécie, encontrado morto (incluindo ossadas) SEM CAUSA ESCLARECIDA ou doente, em qualquer local do território nacional.

 

Epizootia confirmada de FA – Morte de primata não humano, de qualquer espécie, com confirmação de FA, por isolamento de vírus ou outra evidência laboratorial.

 

COLETA DE AMOSTRAS PARA EXAME LABORATORIAL Virologia Sangue (Soro): 0 – 5 dias após o início dos sintomas. Tecidos (óbito): 8 – 24 horas após o óbito. Conservação/Transporte: gelo seco ou congelado a – 70ºC

 

Sorologia 1ª amostra (IgM/IgG): após 5 – 7 dias do início dos sintomas.

2ª amostra (IgG): 14ª – 30ª dias do início dos sintomas.

Como a coleta de amostras em primatas não humanos requer níveis de biossegurança que nem sempre são encontrados, recomenda-se que o profissional médico veterinário entre em contato com os órgãos responsáveis pela notificação no seu município e obtenha as recomendações corretas para envio do animal para diagnóstico. Recomenda-se ainda que realize download do Guia de Vigilância de Epizootias em Primatas não humanos e Entomologia aplicada à vigilância da Febre Amarela para maiores informações.

 

Referências

BAHIA – SESAB. Boletim Epidemiológico da Febre Amarela. SUVISA/DIVEP, Bahia, n.05, Maio/2017. Disponível em: <http://www.suvisa.ba.gov.br/sites/default/files/Boletim%20FA%20n%2005%2008.05.2017.pdf> Acesso em 15 mai. 2017.

 

BRASIL –  Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Guia de vigilância de epizootias em primatas não humanos e entomologia aplicada à vigilância da febre amarela, 2Ed, Brasília: Ministério da Saúde, 2014.

 

 

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