Todos os meses, quando ocorre a solenidade de entrega de carteiras profissionais no Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado da Bahia (CRMV/BA), os novos médicos-veterinários são alertados sobre a necessidade de notificar determinadas enfermidades ao poder público.
Com maior foco na sanidade animal, são distribuídas cópias da Instrução Normativa nº 50, de 24 de setembro de 2013, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) que lista as doenças que o médico-veterinário deve ficar atento para avisar aos serviços de sanidade animal. “O profissional que detectar o problema não é obrigado a tratar, mas a comunicação é compulsória”, explica o médico-veterinário Antônio Valentim, da Agência de Defesa Animal (ADAB).
Zoonoses
No caso de determinadas zoonoses, aquelas doenças que passam dos animais para os seres humanos, é o Ministério da Saúde que elenca na Portaria nº 204/2016 quais devem ser informadas aos gestores de saúde em todo o território nacional. Importante notar que no caso específico da Medicina Veterinária, há ainda a Portaria nº 782/2017, que define a relação de epizootias de notificação compulsória.
Endêmica em regiões da Bahia, como Lauro de Freitas, a leishmaniose é uma delas. Transmitida pela fêmea do mosquito palha (Phlebotominae), a doença infecta cães e seres humanos e tem duas manifestações: Leishmaniose Tegumentar Americana e a Leishmaniose Visceral.
Recentemente, a Organização Pan-americana da Saúde (OPAS) lançou o Manual de Procedimentos para Vigilância e Controle de Leishmaniose nas Américas, para servir de instrumento de apoio para profissionais que trabalham em áreas nas quais a doença é endêmica.
No caso de Salvador, para notificar casos suspeitos, basta ligar para o telefone (71) 3611-7308 do Centro de Controle de Zoonoses, que faz a investigação do caso e oferece o teste para diagnóstico. Para notificações semelhantes no interior do estado, procure a secretaria municipal de saúde de sua cidade.
Esporotricose
Após tomar vulto de epidemia no Rio de Janeiro, os profissionais de saúde da Bahia começaram a notar o aparecimento dessa doença em Camaçari e em Salvador. Causada por fungos, a esporotricose ataca principalmente gatos e seres humanos. O assunto foi tema de um seminário realizado pelo CRMV/BA em julho de 2018.
Chefe do Setor de Vigilância das Zoonoses Transmitidas por Animais de Pequeno Porte, da Secretaria Municipal de Saúde de Salvador, o médico-veterinário Aroldo Borges dá o “caminho das pedras” para o profissional de saúde que se depara com um caso de esporotricose. Membro da Comissão Estadual de Saúde Pública (CESP) do CRMV/BA, Borges destaca que a obrigatoriedade de notificar foi estabelecida na Portaria 191/2018, baixada no município.
Médico-Veterinário Aroldo Borges durante o Seminário sobre Esporotricose em julho de 2018
Na capital baiana, os casos suspeitos de esporotricose animal podem ser notificados por formulário eletrônico ou pelos telefones 3611-7331 e 3611-7310. “O FormSUS“, diz Aroldo, “tem objetivo de facilitar a notificação dos casos suspeitos de esporotricose animal, especialmente para os médicos veterinários, sendo um link direto entre estes profissionais e o CCZ”.
Informação para a população
Era justamente como fazer a notificação em Salvador que a médica-veterinária Shirley Alves Santos estava buscando informações. Ela conta que já atendeu animais com suspeita de leishmaniose e relata que ouviu falar de colegas que já consultaram animais com suspeita de esporotricose em Salvador. Ao comentar que muitas pessoas pensam que gato é culpado e não vítima da esporotricose, ela defende que o poder público faça campanhas informativas em comunidades e em escolas.
Enfática em defender a importância da notificação, Shirley lembra que se trata de um dever do médico-veterinário previsto no Código de Ética.
Utilidade da notificação X Saúde Única
Segundo o boletim epidemiológico sobre esporotricose da Secretaria Municipal de Saúde, em 2018 foram registrados 56 casos suspeitos de esporotricose em humanos e 289 casos suspeitos de esporotricose em animais (92% felinos e 8% caninos). Dos casos animais notificados, 141 foram confirmados por exame em laboratório. Em humanos a doença foi confirmada em 29 pessoas e outros 22 casos ainda estão sob análise.
Ainda pouca compreendida, a importância da notificação compulsória de doenças é destacada pela médica-veterinária Luciana Bahiense da Costa, que é mestre em Ciência Animal nos Trópicos. Membro da CESP-CRMV/BA, ela trabalha na Secretaria de Saúde do Estado da Bahia, vinculada à Coordenação das doenças transmitidas por vetores da Diretoria de Vigilância Epidemiológica.
Ela define que “a Vigilância engloba o diagnóstico precoce, o tratamento oportuno das pessoas com sintomas, sendo a medicação dispensada gratuitamente, além da vigilância de reservatório canino, que é a parte dos animais, e entomológica, que é a parte dos vetores. Na verdade, se combate mais o vetor adulto (o mosquito) através do controle químico e não as larvas, diferente da dengue, por exemplo, visando com isso romper todos os elos da cadeia de transmissão, interromper que a cadeia não se complete, para reduzir a transmissão do parasita”, explica de modo conclusivo.
Ascom CRMV/BA, 22 de abril de 2019